quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Antarctic Expedition of José Abreu (2022-23) (In Portuguese)

 Campanha Antártica 2023 –  projeto cientifico FISHFAN II

 

Por José Abreu (estudante de Doutoramento da Universidade de Coimbra e British Antarctic Survey)

 

Seguindo os passos do projeto FISHFAN da campanha de 2021-2022, o FISHFAN-II ocorreu nesta campanha PROPOLAR de 2022-2023. Desta vez, eu (José Abreu) era único investigador jovem a ir nesta aventura, sendo o meu supervisor José Xavier  (como coordenador do projeto).

Este ano, o projeto dividia-se em duas partes distintas, a primeira seria a bordo de um barco de pesca a operar em volta da Ilha Subantártica da Geórgia do Sul, no sector atlântico do Oceano Austral, e a segunda seria novamente na base científica do British Antarctic Survey de King Edward Point, agora já em terra.

Assim, esta aventura, tem início a 13 de Abril a uma quinta-feira, e lá depois de atravessar o Atlântico e uma série de voos no Chile, chego às Falklands dia 15, sábado. Isto, pois, o único voo comercial para as Ilhas Falklands é entre Punta Arenas, e só ocorre uma vez por semana.

Depois de uma boa noite de descanso, passaria a semana a trabalhar na sede da empresa, tanto no meu doutoramento, mas sobretudo a preparar o material e documentos necessários, assim como a familiarizar me com todos os equipamentos e câmaras que ia usar dentro dos protocolos da empresa. O ambiente era de adrenalina com a preparação de mais uma época de pesca, e ao mesmo tempo para mim de super entusiamo, por ir experienciar algo novo e usar alguns equipamentos pela primeira vez.


 



 

 

 

 

 

 

 

 

Foto: A bordo do Barco de Pesca com a Ilha da Geórgia do Sul ao fundo.

 

Chega assim o dia 23 de Abril, Domingo, onde temos uma reunião com os todos os observadores para a temporada, embarcando de seguida no barco, à nossa espera na baia de Port William, em Stanley (Ilhas Falkland/Islas Malvinas).  A viagem tem como destino Geórgia do Sul, uma travessia que demorou 4 dias, e deu para ir conhecendo os colegas, que iriam ser as pessoas com que ia partilhar os próximos 3 meses, 24h, 7 dias por semana. Num barco não há feriados e muito menos fins de semana. Todos os dias são dias trabalho.

Dia 1 De Maio tem início a época de pesca, e consequentemente o meu trabalho. O objetivo principal era recolher amostras das diferentes espécies de peixes, tanto a espécie alvo, a espécie com valor comercial – Patagonian toothfish como do bycatch, as espécies assessórias, nomeadamente 4 espécies de macrourídeos, e 2 espécies de raia. Além destas mais principais, outras espécies como a Antimora rostrata, ou Muraenolepis spp., também foram recolhidas. Esporadicamente outras espécies apareciam como o caso de cefalópodes (ex.: Lula Galiteuthis glacialis) ou peixes lanterna (também conhecidos como peixes mictofideos). No total recolhemos mais de 700 amostras das diferentes espécies, entre músculo, estômago, otólitos, entre outros para estudos cientificos como parte do meu doutoramento.

 

 

 

 

Foto: Á esquerda, José Abreu com um Patagonian toothfish para ser solto de volta ao mar, depois de marcado para fins científicos. Á direita, José Abreu no laboratório da base, analisar um indivíduo de macrourídeo.

 

Estas amostras juntamente com as do ano anterior, permitirão concluir as nossas análises químicas (ex.: isótopos estáveis), identificação da idade da população, ou mesmo a dieta das diferentes espécies em estudo.

Além da recolha de amostras, milhares de medições e de informações biométricas, como o tamanho, peso, sexo, maturação, foram recolhidas das várias espécies para formular o relatório final. Estar a bordo é uma experiência sempre fantástica, e perceber a dinâmica das operações, distribuições das espécies, e os vários fatores que estão em jogo, é essencial para o nosso papel como biólogos. Estas informações são fundamentais para as nossas análises e para as nossas possíveis recomendações.

 O meu turno de trabalho decorria da 00:00h ao 12h, maioritariamente durante a noite, era neste período que grande parte das linhas de pesca eram retiradas de água, e assim a melhor altura para mim como biólogo poder estar presente.

O pouco tempo que tinha de luz e livre dava para assistir ao magnífico mundo que nos rodeava. Este ano, atipicamente com um número incontável de icebergs que se foram separando do A76a, na altura o maior iceberg à deriva no planeta, e que estava agora retido na plataforma continental da Geórgia do Sul. Foi algo inesperado para mim, pois o mar em redor da ilha nunca fica congelado, e daí ser muito raro estes avistamentos.

Contudo ver estes monumentos flutuantes foi algo impactante para mim, pois a beleza, grandeza e cor destes icebergs é algo extraordinário, no entanto traz consigo o alerta que a realidade é cada vez mais preocupante com a progressiva perda de glaciares.

Além destes pedaços mágicos, a fauna faz se sempre mostras no seu máximo esplendor, com as várias espécies de baleias alimentarem-se do krill antártico, grupos de pinguins a galopar as ondas, e os míticos albatrozes.

 


Foto: Iceberg com 40 metros de altura.

 

 



Por fim em Agosto, já na base, tive oportunidade de concluir a recolha de amostras e selecionar, etiquetar e embalar tudo corretamente de modo a ser transportado para o UK e Portugal, de modo a realizar as análises mencionadas acima. Um mês acelerado, que ainda permitiu rever amigos do ano de 2022, e celebrar a beleza que é este local.

O arquipélago Geórgia do Sul é uma zona riquíssima em biodiversidade e produtividade, albergando inúmeras colónias de espécies icónicas como pinguins rei, lobos marinhos antárticos ou elefantes marinhos, sendo desde 2012 uma área marinha protegida, e as pescas reguladas pelo governo Britânico usando o conselho científico da Comissão para a Conservação dos Recursos Marinhos Vivos da Antártida (CCAMLR) com uma abordagem a todo o ecossistema. Assim compreender a ecologia das espécies que são diretamente afetadas é essencial para ajudar no desenvolvimento das medidas de conservação e gestão.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto: Pinguins gentoo a ir para a colónia depois de se alimentarem no mar.

 

Ser biólogo marinho e ter oportunidade de viver e participar ativamente para a conservação e desenvolvimento sustentável destas regiões é orgulho e paixão enorme. Estas áreas albergam uma biodiversidade única no mundo, e a sua importância é cada vez maior num planeta em rápida mudança.

 

Dia 2 de Setembro, foi então o dia da despedida, com nova travessia até às Ilhas Falklands apanhando o voo com direção a Portugal. Para terminar, gostaríamos de agradecer ao programa polar Português -  PROPOLAR por o apoio nesta campanha essencial para o plano de doutoramento, à ARGOS e observador e amigo Phillip Robyn pela recolha das amostras, e por último ao British Antarctic Survey, ao governo Britânico (GSGSSI), e a todos os elementos com quem partilhamos a base, pela forma que nos trataram e receberam.