sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Regresso | Returning to the real world

A escrever a partir de Cambridge (Reino Unido)
Writing from Cambridge (UK)

















(Bird Island é a segunda ilha a partir da direita| Bird Island is the second island from the right)



Estou de regresso à civilização. Voltar a estar com muitas pessoas volta a ser estranhamente normal. Mas já houve coisas que me aconteceram que me disseram que ainda estou no periodo de adaptação a tudo. Vários exemplos...



Toda a gente é mais linda! Após um longo Inverno, onde 4 caras eram sempre as mesmas, quando passei pelas Falkland começei a ver outras pessoas com outros olhos. É engraçado que todos me pareciam mais bem parecidos do que o normal. Interessante!


















(Será que novos parametros de beleza vieram da Antárctica?| Could it be that beauty as we see it may origin from the Antarctic? Why not?;))


Lembrar do que precisas quando sais de casa. Quando passamos a vida em comunidade, fazemos coisas automaticamente. Ao sair de casa é automático: pegar no telemóvel, carteira, chaves e relógio e vamos embora. Mas quando passas tanto tempo na Antárctica, onde não precisei nada disso, relembrar o que precisas demora um pouco. Engraçado que o meu telemóvel "faleceu" na Antárctica...nem um pequeno sinal de vida;)

















(O sol é sempre bem vindo| The sun is always welcome)


Saber usar o cartão de crédito no supermercado. Já em Cambridge, foi às compras a um supermercado. Demorei muito mais tempo do que o costume, ver onde colocaram os produtos, analisar os melhores preços...demorou tempo pois na Antárctica temos o nosso próprio supermercado onde já sabemos onde está tudo e é grátis. O engraçado foi ao pagar, quando nem me lembrava do codigo nem como se processava o pagamento. Foi engraçado ver a senhora da caixa registadora a olhar para mim com um pequeno sorriso a explicar-lhe que "o cartão põe-se assim e agora é só colocar o codigo."


















(Rodeado de pinguins| Surrounded by macaroni penguins)


Estar no meio de uma multidão. Passei vários meses onde eramos 4 cientistas. Estar no Market Square, em Cambridge num Sabádo de manhã, onde várias centenas ou milhares de pessoas andam de um lado para o outro, super ocupados com as compras semanais, foi uma autêntica festa. Cambridge é excelente pois reune pessoas de todo o mundo, e mais uma vez essa sensação de diversidade humana, todos juntos, felizes com o seu dia a dia, foi bom. O mundo continua mesmo que estejas longe...

É sempre Inverno! Fazer ciência na Antárctica durante o Inverno Austral tem destas coisas. Como lá é Inverno entre Junho e Outubro (e todos em Portugal estão de toalha às costas para ir para a praia), na prática apnho 3 Invernos de seguida: Inverno de 2008-09 no hemisferio norte (Outubro a Março), Inverno na Antárctica 2008-09 no hemisfério sul (Março a Outubro) e agora volto a apanhar o Inverno no hemisfério norte...fácil perceber as saudades do sol....


























( Quem, eu? | Who, me?)


Próximo passo: reuniões! Agora estou com reuniões todos os dias mas tudo bem. Voltar a entrar no ritmo não custa, pois a alegria de rever os amigos e colegas todos sobrepõe-se a tudo. Agora estou na hora de definir novas estratégias de como podemos ajudar todos a perceber a importãncia das regiões polares. De certeza que aventuras não faltarão...mas as marcas da Antárctica ficaram marcadas em mim para sempre...



I am back in the real world, with people and stuff. Being surrounded by more than 4 people is strangely normal. In numerous occasions, I was reminded that I was still in an adaptation period: 1- Everyone looks more beautiful. As I saw other people, all of them looked nicer, more interesting to meet in the Falklands, 2- Remember what you need. When leaving home it was hard to remind myself that I need a mobile, wallet, watch and keys, 3- Know how to use a credit card. While in the supermarket, it was funny to see the smile of the lady of the payment desk while showing me how to use my credit card and where to put it for the payment (the system changed while I was away), 3- Being in a crowd. Cambridge is great on Saturday mornings when hundreds/thousands of people decide to go shopping in the city centre. Being surrounded by them , made me feel that world carries on, with or without you...it was nice!, 4- It is always winter. This is my 3th Winter in a row!!! I done the Winter 2008-09 in the north hemisphere (October-March), Winter 2008-09 (March-October) in the South hemisphere and now Winter again in the north hemishpere. No wonder I love the sun!!! The next step in to get a new strategy to show everyone of the importance of the polar regions....Surely new adventures will come but the Antarctic expereinces will be part of me forever...

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Retroceder no tempo| Go back in time

A escrever a partir de Signy Island (Antárctica)
Writing from Signy Island (Antarctic)













(Base cientifica Britanica em Signy Island | Signy Island Research Station of the British Antarctic Survery, Natural Environment Research Council)


Foi como um sonho. Apareceu sem perceber, ocupou todos os meus momentos por horas e desapareceu tal como surgiu. Signy Island é assim...um sonho. E como já estou a escrever a partir do RRS James Clark Ross, o navio oceanográfico da British Antarctic
Survey, já a caminho das Ilhas Falklands, após 3 dias “a correr” em Signy Island, parece inglório.













(Gelo a quebrar-se| Climate change in action!)

Signy Island fica nas Orcadas do Sul, junto ao continente Antárctida e fica a 3 dias de navio a sul de Bird Island. Ter ido a Signy Island é como ir a Bird Island em Julho ou Agosto. Retrocedes no tempo. Em Signy Island ainda está tudo coberto de neve espessa, vê-se uns poucos elefantes marinhos curiosos e algumasotárias do Antárctico. O único som vibrante que causa uma alegre impressão é o som dos pombos Cape (também chamados Cape Petrels) que fazem uma autêntica festa na colónia mesmo ao lado da base, nuns rochedos enormes. Como analogia, Bird Island é agora como o calor de Agosto do nosso Verão enquanto Signy ainda está com o calor de Maio. Bird Island transborda de vida agora, com animais por todo o lado, mesmo sendo uma epoca um pouco estranha cientificamente.










(Dizer adeus!| Saying goodbye)

Antes de chegar a Signy Island, repara-se no tom cinzento do céu que me faz lembr

ar a cor nostálgica de o primeiro dia de cada ano quando acordamos um pouco mais cansados do que o normal. As Orcadas do Sul evidenciam força nas suas montanhas com neve que sobrevivem à milhares de anos contra este clima violento, e muitos icebergues, alguns deles já de um tamanho apreciável. O navio abrandou a velocidade em caso de haver um icebergue mais disfarçado que nos possa causar transtorno. No dia seguinte foi acordar às 7 da manhã para tratar de ajudar a abrir a base cientifica de Signy, onde se faz muitos estudos de pinguins (Adélie e chinstrap) e também de lagos e de vegetação.










(Elefante marinho em Signy Island| Elephant seal at Signy Island)

Os 2 dias seguintes foi tratar de pôr os geradores de energia a funcionar, deslocar montes de neve para fora do perimetro da base, e no final abastecê-la de mantimentos para os próximos meses. Foi intensivo mas interessante pois deu-me uma perspectiva do que é preciso numa base cientifica, toda a enorme logistica (temos de saber onde estão todos os pacotes em qualquer altura) e como todos colaboram como uma equipa.










(As despedidas| The last words...)

Foi o mesmo em Bird Island há uma semana atrás. Transportar tudo o que não era necessário para o navio e abastecer a base com comida, material cientifico e tudo o que é necessário para a base funcionar a 100% nos próximos meses. E todo este trabalho para que todos os cientistas possam trabalhar em segurança e realizar os seus estudos...pois tudo isto é por causa da ciência!

Já disse adeus a Signy Island e às maravilhosas 6 pessoas que lá ficaram. Agora, é olhar para o futuro...Ilhas Falklands, Reino Unido, Portugal...e voltar a casa com um grande sorriso!!!

Até já!










(no mar alto junto as Orcadas do Sul| In high seas offshore South Orkneys)

It was like a dream!It came like an unexpected guest, took all your attention for hours and then left just as it arrived... Signy Island is like that...a dream! I am already writing from the RRS James Clark Ross, of the British Antarctic Survey, on our way to the Falkland Islands. And after so busy 3 days, there is a sense of injustice as time flew so fast. Signy Island is part of the South Orkneys, very close to the Antarctic continent, and 3 days from Bird Island, which further north. Going to Signy Island is like going back in time. Whereas Signy Island is still covered with lots of snow and there are numerous icebergues around, at Bird Island the snow is already scarce and animals are everywhere, even if this season is a strange one. We came here to open the Signy Island research Base of the British Antarctic Survey. There will be 6 people this summer working on penguins, lichens and seals. Already said goodbye to the people that stayed there and now I am looking forward to the future, to be in the Falkland Islands, UK and going back home with a huge smile...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Explicar para perceber| Explain to understand

A escrever a partir de Bird Island, Geórgia do Sul (Antárctica)
Writing from Bird Island, South Georgia (Antarctic)










(Pinguim Macaroni Eudyptes chrysolophus a construir o seu ninho esta semana| A Macaroni penguin Eudyptes chrysolophus constructing its nest this week)

Estou prestes a deixar Bird Island! Sinto que é como deixar um grande amigo após termos passado uns excelentes dias/semanas (nestes caso meses) juntos. Sim, temos uma alegria imensa de termos vivido grandes aventuras juntos, de ter partilhado momentos únicos que nos vão ficar marcados para o resto da vida. Pode ser desde as pequenas coisas como o som dos pequenos passarinhos (chamados pipits) que nos acompanha ao longo do nosso percurso até às colónias de pinguins e albatrozes, da alegria que ver o primeiro elefante marinho de 3-4 toneladas, de pegar novamente num pinguim, de me deixar fazer snowboard nas suas encostas, a apreciar como um pinguim macaroni usa as suas pedras para formar o seu ninho e ouvir o som de “avião” de um albatroz viajeiro a chegar à sua colónia.












(40 000 pinguim Macaroni Eudyptes chrysolophus na colónia em Big Mac| 40 000 Macaroni penguins Eudyptes chrysolophus at Big Mac colony)


Esta expedição cientifica, a mais longa de sempre para um cientista português na Antárctica, foi deveras apaixonante. Cientificamente, foi sem dúvida! Os meus estudos sobre a dieta dos pinguins gentoo durante o Inverno mostram uma diversidade de alimentos muito elevada, talvez demais do que costuma ser. Sabendo que os pinguins gentoo normalmente alimentam-se do camarão do Antárctico (e por veze

s de peixe) e pouco mais, regressam todos os dias a terra e normalmente procuram alimento num raio de 20 km , estes resultados leva-me a supor que as populações de pinguins gentoo na Geórgia do Sul poderão ser afectados com alterações acentuadas de alterações climáticas que podem afectar o sistema marinho.
















(Albatroz viajeiro Diomedea exulans após mais uma das suas viagens pela Antárctica e arredores| Wandering albatross Diomedea exulans after another trip in Antarctic and adjacent waters)


Os estudos de rastreio por GPS de albatrozes viajeiros mostram que existe uma ligação forte entre as areas sobrevoadas (quando estão à procura de alimento) ao longo do ano, com as suas viagens a deslocaram-se cada vez mais para norte (para perto do Brazil), em vez que ficarem em águas do Antárctico. Mais existe uma ligação também associada ao que se alimentam, com uma mudança de dieta de peixe (do Antártico) para lulas (do sub-Antárctico), com estas lulas a aparecerem com espermatóforos (o que significa que se estão numa fase avançada de idade e prontas para se reproduzir). Tudo isto, neste Inverno....

















(Albatroz de sobrancelha preta Thalassarche melanophrys| Black-browed albatross Thalassarche melanophrys)

Mas tal como quando alguém muito querido nos deixa, existe uma sensação de nostalgia que se transmite com a sensação de “nunca mais vou viver estes momentos contigo.” Pelo menos neste contexto, com estas pessoas, com estes animais, com estas questões cientificas por responder...

Para perceber o quanto importante Bird Island é, nada melhor do que a mostrar a pessoas que nunca a conheceram. Dizer-lhes que o seu humor é único, que os seus albatrosses preferem voar o longo dos seus montes , que os elefantes marinhos só aparecerem a partir do fim de Setembro, que os pinguins Macaroni agora são cerca de 40 000 e são só os machos (as fêmeas veem a caminho), que os albatrosses sooties voam aos pares, reproduzem-se em autênticos desfiladeiros e que possuem uma voz hipnotizante.



Quando o navio James Clark Ross chegou, no dia 1 para fazer a “first call”, onde tudo o que é necessário para esta época é enviado para Bird Island (comida, combústivel, material cientifico, literalmente tudo) e material reutilizável (e para ser descartado) é enviado para o navio. Para ajudar temos 15-20 pessoas a nos ajudar. Tive o prazer de levar algumas destas pessoas para obervarem ao vivo a colónia dos “meus” albatrozes, colónia dos pinguins Macaroni de 40 000 pinguins, as colónias dos albatrozes de cabeça cinzenta e de cabeça preta, e os elefantes marinhos e as otárias do Antárctico nas praias. Enquanto explicava alguns pormenores da biologia das várias espécies, onde costumam viver, quando se reproduzem, do que se alimentam, de como é pegar num pinguim,...tudo isso me levou a mais uma vez perceber o quanto fabulosa esta ilha é. Todos os presentes tinham os olhos a brilhar de satisfação....

Mas claro, com o tempo passa, e a vida continua...até breve Bird Island!


I am about to leave Bird Island. It feels like leaving one of our dearest friends after spending a great few days/weeks/months together and now you get the feeling that you might not see them again. Even the little things are special to remember, like the pipits singing to me on my way to the wandering albatross colony, like try to guide me, or the privilige of touching penguins with my own hands, or hearing the sound of sooty albatrosses live! Scientifically, it was a great season. Gentoos had a very strange Winter, feeding on amphipods, which was quite a surprise as they were expected to feed on krill mostly. The wandering albatross GPS work showed that squid play a major role in their diets, but increasingly so as the season develops. It is hard to leave Bird Island. It is like having the feeling of knowing that these moments might not repeat again ever. To understand how important Bird Island is, there was nothing better that showing it to people. On the James Clark Ross first call, I had the opportunity to talk about the science, the fauna and flora of why Bird Island is so special. The great pleasure of showing a colony of Macaroni penguins with 40 000 penguins, or going through a colony of the amazing wandering albatrosses. It is time to leave Bird Island...life must go on...see you soon Bird Island!