sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

7. O "dia" de um estudante


Se és um estudante de Biologia e estas a ler este blog, imagina que daqui a umas semanas alguém te faz um convite para vires fazer trabalho de campo a Antárctida, como reagias? E uma pergunta no minimo estranha, mas foi o que me aconteceu!!

Estava no meu último ano de licenciatura, a fase complicada em que tinha que decidir a área a seguir no mestrado...que acabou por recair em ecologia na Universidade de Coimbra. Fui então falar com diferentes professores para perceber os projectos de investigação em que me poderia integrar. Uns dos que mais me cativaram foram os do grupo do Investigador José Xavier, do Instituto do Mar (IMAR-CMA) da Universidade de Coimbra, sobre Ecologia Marinha na Antártica. Para além do obvio interesse em pinguins, por serem animais tão carismáticos, as interacções predador-presa sempre foi algo que me despertava interesse. Optei por um projecto que iria estudar a ecologia trófica de vários predadores, incluindo albatrozes, o Bacalha

u do Antárctico e pinguins, focando particularmente na importância dos cefalópodes (lulas e polvos) no Oceano Antárctico. Ingressei assim este fantástico grupo de trabalho em Abril de 2011.

Semanas depois, já tinha realizado algum trabalho no laboratório, e ajudei outros colegas nos seus projectos de Mestrado mais adiantados (mostrando dedicação e o gosto que tenho pela ciência), tive uma nova reunião com o meu orientador de mestrado, para falar sobre o ponto de situação de todo o projecto. Uma reunião perfeitamente normal, até que no final o José me perguntou “Há uma possibilidade muito remota de no próximo ano (ou seja agora!!!) haver uma expedição à Antártica. Se eu te perguntasse se querias participar, qual seria a tua disponibilidade?”, como é obvio a minha resposta foi um “Claro que sim!” quase instantâneo! Sai do gabinete com um enorme sorriso na cara, não é todos os dias que nos fazem propostas destas, mas estava com os pés bem assentes na terra, tendo perfeita noção que ainda era um possibilidade muito remota.


A confirmação que eu tanto ansiava veio em Agosto! O convite foi oficializado! Se antes já passava algum do meu tempo a sonhar com esta viagem de sonho, a partir desta reunião não houve dia em que o continente branco não tenha passado umas boas horas no meu pensamento!


O tempo até a semana do embarque passou a voar, com os preparativos e uma reunião com todas as equipas da 1 campanhã Polar Portuguesa! Quando dei por mim estava a menos de 5 dias, mas foram 5 dias em que parecia que o relógio tinha parado...A viagem fez-se bastante bem, até a chegada da Passagem de Drake (que fica entre a América do Sul e a Antártica)! Mas este episodio já foi falado anteriormente no blog;)


Assim que vi o meu primeiro pinguim a menos de 2 metros de mim, era um pinguins de barbicha que estava na praia da base bulgara, todas as dificuldades da viagem de barco desapareceram! Devo ter feito mais de 100 fotos dele! São, sem dúvida, os animais mais engraçados que alguma vez vi! Mas não são só os pinguins que fascinam, aqui tudo é espetacular! O azul do glaciar, o branco da neve, o brilho do sol, parece que são diferentes aqui! Há um sentimento de paz e calma a pairar no ar!


Todos os dias são dias de arduo trabalho mas ao estar aqui , os dias têm um brilho especial e diferente. Os melhores são aqueles em que o tempo nos permite ir até as colónias, são locais indescrítiveis que transbordam vida! A Antártida é, para mim, o melhor local de trabalho de todo o mundo, mas como tudo o que é bom, não é fácil! Como temos um periodo para o trabalho de trabalho limitado (só estaremos aqui cerca de 40 dias), é tudo muito intensivo, não nos podemos dar ao luxo de tirar dias de folga, não há fins de semana e trabalha-se com temperaturas muito negativas, com vento e neve à mistura! É duro, mas tudo vale a pena quando vemos um pequeno pinguim a sair das nossas mãos a andar e a seguir a sua vida como se nada se tivesse passado!


A experiência que ganhei no último mês vai mudar muitos aspectos da minha vida quando voltar a “terra-mãe” tanto a nível profissional, porque adquiri técnicas e métodos muito importantes, como a nível pessoal. Aqui, aprendemos a relativizar as coisas (não morro se não beber coca-cola todos os dias!) com uma vida sem acesso à internet, sem TV, sem cinema, sem telefone, sem sms gratuitos, sem outros dos muitos facilitimos da aldeia globlal. Mas tudo é perfeitamente funcional e até mais saudável...não há outra opção, estamos literalmente no fim do mundo!!!!


José Seco

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